sinfonia em branco
Já cá tinha o livro desde que o Saint mo ofereceu, em Abril do ano passado, quando nos encontrámos no Rio. Eu sentia um certo peso na consciência por ainda não o ter lido, sobretudo porque o Saint mo tinha recomendado muito e porque sentia nele alguma tristeza pelo facto de eu não o ter lido. Bem, o que posso dizer é que o livro tinha um encontro marcado comigo, e o destino desfrutava esse lento passar das horas que sabia inexorável.
Falo de Sinfonia em Branco, de Adriana Lisboa (livro premiado com o prémio Saramago, e que foi editado com destaque em Portugal), uma história de duas irmãs que convivem com uma ferida profundíssima, que vem desde lá dos confins da adolescência e que lhes marca (inquina, envenena, contamina) toda a vida, desde as decisões mais marcantes aos mais alheios gestos do quotidiano.
Mas o que é notável no livro de AL é a linguagem. Escrito num estilo não descritivo, sem preocupação de cronologia ou linearidade, a história vai se compondo, vai sendo construída, à nossa frente, diante dos nossos olhos; o livro vai surgindo, vai ganhando volume nas nossas mãos, começa por uma frase e é como se crescesse já nosso, qualquer coisa que faz parte de nós.
O resultado é uma teia delicadíssima, um coração de filigrana, um conjunto de fios, de ideias, de coisas subtis, mas tão poderosas, que se entrelaçam e desenham, com um rigor e um recorte extraordinários, as personagens, todas sem dúvida, mas sobretudo as duas irmãs. Eu não sei se consigo dizer isto com justeza, mas só o lugar comum funciona: Clarice e Maria Inês ganham verdadeiramente vida, adquirem espessura, tornam-se densas e profundas. Ficamos a conhecê-las, mas nesse sentido mágico em que nos conhecemos uns aos outros, com a certeza de que quanto mais conhecemos uma pessoa, maior é o mistério que ela encerra, menos linear se torna, mais surpreendente e inesperada.
Mas apesar da escrita entretecida, Sinfonia em Branco não resulta num livro complicado ou denso, daqueles de difícil leitura, em que temos de retomar muitas vezes a leitura de uma frase para lhe percebermos o sentido. Aqui, quando repetimos a leitura é mesmo só para desfrutar do prazer de ler, para sentir novamente a beleza das palavras. Porque de resto o livro é facílimo de ler, não é complicado, não se entorpeça. O texto é de uma desarmante simplicidade, não há significados ou sentidos obscuros, tudo é o que está à vista. E o segredo do livro, quer dizer, a sua glória, é essa, conseguir mostrar o coração das personagens de uma maneira descomplexada, simples.
Como já referi, o livro aborda as marcas que uma ferida profunda deixou na vida das personagens. E fá-lo de uma forma não descritiva, mostrando em vez de descrever. Como se a autora nos pegasse na mão e nos fizesse passar devagar o dedo pelas cicatrizes, pelas físicas mas também pelas emocionais, das duas irmãs. E é esse momento de intimidade, em que sentimos na nossa pele a vida de outrem, que tornam este livro de Adriana Lisboa tão único e extraordinário.
Falo de Sinfonia em Branco, de Adriana Lisboa (livro premiado com o prémio Saramago, e que foi editado com destaque em Portugal), uma história de duas irmãs que convivem com uma ferida profundíssima, que vem desde lá dos confins da adolescência e que lhes marca (inquina, envenena, contamina) toda a vida, desde as decisões mais marcantes aos mais alheios gestos do quotidiano.
Mas o que é notável no livro de AL é a linguagem. Escrito num estilo não descritivo, sem preocupação de cronologia ou linearidade, a história vai se compondo, vai sendo construída, à nossa frente, diante dos nossos olhos; o livro vai surgindo, vai ganhando volume nas nossas mãos, começa por uma frase e é como se crescesse já nosso, qualquer coisa que faz parte de nós.
O resultado é uma teia delicadíssima, um coração de filigrana, um conjunto de fios, de ideias, de coisas subtis, mas tão poderosas, que se entrelaçam e desenham, com um rigor e um recorte extraordinários, as personagens, todas sem dúvida, mas sobretudo as duas irmãs. Eu não sei se consigo dizer isto com justeza, mas só o lugar comum funciona: Clarice e Maria Inês ganham verdadeiramente vida, adquirem espessura, tornam-se densas e profundas. Ficamos a conhecê-las, mas nesse sentido mágico em que nos conhecemos uns aos outros, com a certeza de que quanto mais conhecemos uma pessoa, maior é o mistério que ela encerra, menos linear se torna, mais surpreendente e inesperada.
Mas apesar da escrita entretecida, Sinfonia em Branco não resulta num livro complicado ou denso, daqueles de difícil leitura, em que temos de retomar muitas vezes a leitura de uma frase para lhe percebermos o sentido. Aqui, quando repetimos a leitura é mesmo só para desfrutar do prazer de ler, para sentir novamente a beleza das palavras. Porque de resto o livro é facílimo de ler, não é complicado, não se entorpeça. O texto é de uma desarmante simplicidade, não há significados ou sentidos obscuros, tudo é o que está à vista. E o segredo do livro, quer dizer, a sua glória, é essa, conseguir mostrar o coração das personagens de uma maneira descomplexada, simples.
Como já referi, o livro aborda as marcas que uma ferida profunda deixou na vida das personagens. E fá-lo de uma forma não descritiva, mostrando em vez de descrever. Como se a autora nos pegasse na mão e nos fizesse passar devagar o dedo pelas cicatrizes, pelas físicas mas também pelas emocionais, das duas irmãs. E é esse momento de intimidade, em que sentimos na nossa pele a vida de outrem, que tornam este livro de Adriana Lisboa tão único e extraordinário.